Há duas posições respeitáveis quanto ao Kosovo. Uma advoga a sua independência no quadro da aplicação do princípio de que um território onde houver uma nacionalidade numericamente dominante deve poder tornar-se independente, se for essa a vontade do respectivo povo democraticamente manifestada, de um modo justo, fiável e inequívoco.
Outra sustenta a perenidade da sua ligação à Sérvia com base na estabilidade das fronteiras, regra de convivência vigente na comunidade internacional, reconhecida quer pela União Europeia, quer pela ONU, especialmente, quando radicada em razões históricas evidentes.
Não sendo esta a oportunidade para um debate aprofundado, apenas digo que, de acordo com os dados de que disponho actualmente, me inclino mais para a primeira solução. Sou, por isso, partidário da independência do Kosovo. Mas sou-o dentro dos parâmetros acima fixados: ser este caso um afloramento de uma regra de aplicação universal, em que outros povos, em circunstâncias semelhantes, obtivessem o mesmo tratamento.
Admito até que possa haver uma ponderação de especificidades regionais e geopolíticas que conduzam a diferir no tempo o desenrolar de outros processos semelhantes. Mas acho inadmissível que, pelo menos na antiga Jugoslávia, os diversos casos existentes não tenham tratamento igual.
Por isso, encaro a independência do Kosovo, posta em prática como um processo isolado, uma vergonhosa arbitrariedade das potências dominantes, que se reveste de uma particular gravidade no que concerne à União Europeia, que poderá vir a pagar caro a ligeireza com que está a agir neste caso.
É, na verdade, uma inimaginável violência simbólica anti-Sérvia promover a independência do Kosovo e recusando-a ao mesmo tempo à República Sérvia que existe, bem identificada, dentro da Bósnia. Essa simultaneidade era o mínimo dos mínimos para se criar verosimilhança na alegação de que não estamos perante uma pura aplicação da lei do mais forte. Mais tarde, poder-se-ia analisar o problema das regiões povoadas predominantemente por sérvios há centenas de anos e situadas na Croácia; ou o das regiões da Bósnia habitadas predominantemente por croatas.
A União Europeia vai, sem consenso interno completo, ser cúmplice desta humilhação histórica unilateral do povo sérvio, dando um precioso presente póstumo a Milosevic. De facto, ela confirmará o que esse dirigente nacionalista sérvio sempre quis fazer crer ao seu povo : a fúria dos ocidentais não era apenas, nem principalmente, contra ele, era contra os sérvios, em geral. Sérvios esses que, aliás, acabam de eleger um presidente pró-União Europeia e vão poucos dias depois receber esta resposta pequena e mesquinha de uma União Europeia, que assim se reduz nesta atitude ao que de pior têm para recordar na respectiva história alguns dos seus Estados membros.
O Kosovo vai ser independente. A Sérvia vai ficar ferida. A União Europeia vai mandar uma autoridade não sei quê para o Kosovo, não sei á luz de que legitimidade, não sei à luz de que legalidade internacional, não sei à luz de que decisão da ONU. Essa missão representará toda a União , ou apenas os países europeus que aceitam a independência do Kosovo ?
É um dia feliz para os albaneses, é um dia triste para os sérvios, pode ser um dia fatal para a dignidade da União Europeia, que , talvez, pela primeira vez se afirme pela lei da força , em termos geopolíticos.
Outra sustenta a perenidade da sua ligação à Sérvia com base na estabilidade das fronteiras, regra de convivência vigente na comunidade internacional, reconhecida quer pela União Europeia, quer pela ONU, especialmente, quando radicada em razões históricas evidentes.
Não sendo esta a oportunidade para um debate aprofundado, apenas digo que, de acordo com os dados de que disponho actualmente, me inclino mais para a primeira solução. Sou, por isso, partidário da independência do Kosovo. Mas sou-o dentro dos parâmetros acima fixados: ser este caso um afloramento de uma regra de aplicação universal, em que outros povos, em circunstâncias semelhantes, obtivessem o mesmo tratamento.
Admito até que possa haver uma ponderação de especificidades regionais e geopolíticas que conduzam a diferir no tempo o desenrolar de outros processos semelhantes. Mas acho inadmissível que, pelo menos na antiga Jugoslávia, os diversos casos existentes não tenham tratamento igual.
Por isso, encaro a independência do Kosovo, posta em prática como um processo isolado, uma vergonhosa arbitrariedade das potências dominantes, que se reveste de uma particular gravidade no que concerne à União Europeia, que poderá vir a pagar caro a ligeireza com que está a agir neste caso.
É, na verdade, uma inimaginável violência simbólica anti-Sérvia promover a independência do Kosovo e recusando-a ao mesmo tempo à República Sérvia que existe, bem identificada, dentro da Bósnia. Essa simultaneidade era o mínimo dos mínimos para se criar verosimilhança na alegação de que não estamos perante uma pura aplicação da lei do mais forte. Mais tarde, poder-se-ia analisar o problema das regiões povoadas predominantemente por sérvios há centenas de anos e situadas na Croácia; ou o das regiões da Bósnia habitadas predominantemente por croatas.
A União Europeia vai, sem consenso interno completo, ser cúmplice desta humilhação histórica unilateral do povo sérvio, dando um precioso presente póstumo a Milosevic. De facto, ela confirmará o que esse dirigente nacionalista sérvio sempre quis fazer crer ao seu povo : a fúria dos ocidentais não era apenas, nem principalmente, contra ele, era contra os sérvios, em geral. Sérvios esses que, aliás, acabam de eleger um presidente pró-União Europeia e vão poucos dias depois receber esta resposta pequena e mesquinha de uma União Europeia, que assim se reduz nesta atitude ao que de pior têm para recordar na respectiva história alguns dos seus Estados membros.
O Kosovo vai ser independente. A Sérvia vai ficar ferida. A União Europeia vai mandar uma autoridade não sei quê para o Kosovo, não sei á luz de que legitimidade, não sei à luz de que legalidade internacional, não sei à luz de que decisão da ONU. Essa missão representará toda a União , ou apenas os países europeus que aceitam a independência do Kosovo ?
É um dia feliz para os albaneses, é um dia triste para os sérvios, pode ser um dia fatal para a dignidade da União Europeia, que , talvez, pela primeira vez se afirme pela lei da força , em termos geopolíticos.
No plano mundial, os grandes espaços estão a aprender a valorizar os seus recursos simbólicos, o seu prestígio cultural, político e ético. A União Europeia está entre os mais prestigiados em alguns deses planos. Hoje, pode ser o dia em que perde a face, no plano de uma ética de respeito por todos os povos, de uma ética de tratamento igual a situações iguais, numa ética de não discriminação negativa de nenhum povo.
De facto, estamos a assistir não à “bushização” da Europa, mas pior do que isso, a uma caricatura pífia dessa “bushização”, que dá bem a medida da rasteirice política dos chamados “leaders”europeus, que, verdadeiramente, parecem não ser mais do que uns amanuenses da política que se passeiam de capital em capital, recitando solenemente o óbvio e deixando que o tempo se lhes escape entre os dedos.
Se a União Europeia quiser recuperar a autoridade moral e política que hoje tão grosseiramente vai delapidar, tem que aprender a não se comportar perante nenhum Estado “fraco”de uma maneira diferente daquela que seja capaz de assumir perante o mais forte dos Estados “fortes”.
Os nossos actuais líderes europeus não deram indicações de que tenham percebido isso. Vão hoje tomar uma posição que provavelmente não tomariam se previamente pedissem autorização para isso aos cidadãos europeus que dizem representar.
E os portugueses? Vão de novo limitar-se a servir um “cafezinho” aos senhores que tomam as decisões?
De facto, estamos a assistir não à “bushização” da Europa, mas pior do que isso, a uma caricatura pífia dessa “bushização”, que dá bem a medida da rasteirice política dos chamados “leaders”europeus, que, verdadeiramente, parecem não ser mais do que uns amanuenses da política que se passeiam de capital em capital, recitando solenemente o óbvio e deixando que o tempo se lhes escape entre os dedos.
Se a União Europeia quiser recuperar a autoridade moral e política que hoje tão grosseiramente vai delapidar, tem que aprender a não se comportar perante nenhum Estado “fraco”de uma maneira diferente daquela que seja capaz de assumir perante o mais forte dos Estados “fortes”.
Os nossos actuais líderes europeus não deram indicações de que tenham percebido isso. Vão hoje tomar uma posição que provavelmente não tomariam se previamente pedissem autorização para isso aos cidadãos europeus que dizem representar.
E os portugueses? Vão de novo limitar-se a servir um “cafezinho” aos senhores que tomam as decisões?
2 comentários:
A independência do Kosovo é, do meu ponto de vista, um tiro num ninho de vespas. Os Américas têm sido peritos nessa estratégia: disse-o ou escrevi-o quando foi da invasão do Iraque...e hoje, é o que estamos a saber...
Só que neste caso tudo pode acontecer para além do simples e confortável saber. Vamos sentir na pele as consequências duma independência burra e cabresta. O coice pode cá chegar muito facilmente.
Da ex-Jugoslávia já temos A Eslovénia, a Croácia, a Bósnia, o Montenegro, a Macedónia, e agora o Kosovo. A Sérvia era o coere da antiga Jugoslávia.
O conceito de pátria é um conceito medieval, com certeza. E muito mais válido será o conceito de região. Até do ponto de vista da operacionalidade de gestão da coisa pública...
Mas olhemos para a Ibéria, que a nós nos toca. O s Bascos não têm mais individualidade que o kosovo? E a Catalunha? e a Galíza? e as Astúrias? e a Cantábria? e a Andaluzia?
num momento histórico em se procura a agregação sob grandes valores apoia-se a independência raivosa do Kosovo?
ESta Europa também está de cócoras ante o Bush.... Nunca pensei que tal fosse possível. Eu cago nas pátrias: já foi assim com os latinos e ainda não aprendemos: ubi bene ibi patria: Quero uma ilha!!!!!!!!!!!!!
Zedomar
Isso mesmo!
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