terça-feira, 26 de novembro de 2013

O PASSADO COM PÉS DE BARRO


O Prof. Oráculo de Sousa ilustrou bem, na sua mais recente conversa de domingo, o espírito da estranha cerimónia ontem urdida em torno de Eanes, com o pretexto de comemorar o 25 de Novembro.

Havia que contrapor o exemplaríssimo Eanes, um ex-Presidente como deve ser, ao pouco recomendável Soares, excessivamente apostado em dizer coisas de esquerda. Não me passa pela cabeça demonizar o primeiro; e o segundo não precisa de ser santificado. Mas não quero ser vítima de ilusionismos.

Votei em Otelo contra Eanes, mas não pude deixar de optar por este contra Soares Carneiro.Mas muitos dos que beatamente fingiram ontem venerá-lo foram ostensivos apoiantes deste último.

É certo que o circunspecto Eanes já saiu do seu  pedestal de alegada  isenção para dar publicamente uma forcinha ao Presidente que estamos a sofrer, quando este queria ser eleito. Mas realmente o que os promotores do evento de ontem pretenderam foi usar Eanes como arma de arremesso contra Soares.Julgando estarem a diminuir o segundo estavam afinal a apoucar o primeiro, deixando bem claro que ele apenas pode servir como um instrumento, já que não tem dimensão para ser uma referência histórica.

Prudentemente, o PS deixou escorrer algumas das suas figuras para dar algum colorido à cerimónia, fazendo de conta que ela era apenas o que os seus promotores queriam fazer crer. Fiquei com alguma incomodidade.Um observador mais distraído podia pensar  que , no fundo no fundo, estava a reconhecer alguma razão ao Prof Oráculo. Ora, este exuberante comentador de domingo não só não teve razão, como distorceu grosseiramente a atitude que realmente Eanes teve como Presidente, pelo menos no que diz respeito ao PS. 

A Eanes não têm que se  regatear méritos, mas não se pode ignorar uma mancha indelével nas suas relações com o PS: a fundação do PRD que viria a liderar. Realmente, ele fora eleito duas vezes com o apoio do PS, sendo duvidoso que o tivesse sido se o PS apoiasse uma outra candidatura contra ele. E mesmo quando Soares lhe retirou o apoio pessoal na segunda candidatura, o PS como partido empenhou-se na sua eleição. E, no entanto, Eanes não hesitou em criar um partido, usando o seu lugar de Presidente (ainda que sem frontalidade), para procurar destruir o PS. Não o conseguiu, mas foi um elemento determinante para a abertura de portas a dez anos de cavaquismo.

Já se vê que o seráfico Eanes esteve longe de ter uma atitude angélica no que diz respeito ao PS. Admito que em política não se devam alimentar rancores por causa de episódios que vão ficando remotos, mas uma organização com profundidade histórica tem que ter sempre a memória bem acordada.

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