Se os cultivadores da continuidade do sistema capitalista apenas parecem saber incentivar o pessimismo dos povos, convidando-os ao sofrimento, para poderem acariciar o capital e os seus detentores enquanto tais, numa ternura que a prática tem mostrado ser inútil, dê-se a palavra a quem não se conforma que a sobrevivência da humanidade seja sacrificada no altar da conservação dos privilégios de que o capitalismo precisa.
Seja pois dada a palavra a Robert Kurz, ensaísta alemão nascido em 1943, que participou em 1986 na criação da revista Krisis e do correspondente grupo, do qual se separou em 2004, envolvendo-se na criação de um novo grupo, em torno de uma nova revista: EXIT! (Crítica e Crise da Sociedade da Mercadoria). Escreve com regularidade em jornais e revistas da Alemanha, Áustria, Suíça e Brasil.
O texto abaixo transcrito foi-me enviado, em boa hora, pelo Luís Namorado, meu irmão, podendo ser encontrado em http://obeco.planetaclix.pt/rkurz399.htm .
Eis o texto:
Seja pois dada a palavra a Robert Kurz, ensaísta alemão nascido em 1943, que participou em 1986 na criação da revista Krisis e do correspondente grupo, do qual se separou em 2004, envolvendo-se na criação de um novo grupo, em torno de uma nova revista: EXIT! (Crítica e Crise da Sociedade da Mercadoria). Escreve com regularidade em jornais e revistas da Alemanha, Áustria, Suíça e Brasil.
O texto abaixo transcrito foi-me enviado, em boa hora, pelo Luís Namorado, meu irmão, podendo ser encontrado em http://obeco.planetaclix.pt/rkurz399.htm .
Eis o texto:
Robert Kurz
EUTANÁSIA ECONÓMICA
Na ideologia da economia política, o dinheiro é uma ferramenta sofisticada para fornecer da melhor maneira bens materiais e serviços sociais à sociedade; precisamente por isso, ele seria irrelevante no verdadeiro sentido económico, não passando de um "véu" sobre a produção e a distribuição reais. Marx, no entanto, mostrou que o dinheiro, como autovalorização do capital, é um fim em si mesmo fetichista, que submeteu a si a satisfação das necessidades concretas. Os bens reais apenas são produzidos se servirem para esse fim em si da multiplicação do dinheiro; caso contrário a sua produção é parada, embora seja tecnicamente possível e constitua mesmo uma necessidade vital. Isto é particularmente evidente em áreas como as pensões e os cuidados de saúde, que em si não são suportes da valorização do capital, mas têm de ser financiadas com os salários e os lucros. No plano puramente factual estão disponíveis recursos suficientes para fornecer à população alimentos e cuidados médicos, mesmo que seja cada vez maior a proporção de não activos profissionalmente. Mas, sob os ditames do fetiche dinheiro, esta possibilidade objectiva torna-se "infinanciável".
Sistemas de pensões e seguros de saúde estão indirectamente subordinados aos ditames da valorização abstracta. Sob condições de financiamento difíceis eles são "economificados". Isso significa que eles mesmos devem agir de acordo com critérios económicos, a fim de poderem participar nos fluxos financeiros. Até o diagnóstico médico se torna uma mercadoria, que está sob pressão da concorrência. O objectivo não é a saúde e o bem-estar das pessoas, mas o doping para a "produtividade", por um lado, e a gestão das doenças, por outro. A pessoa ideal para as instituições vigentes seria um lutador olímpico no local de trabalho (para aumentar o produto nacional), que simultaneamente pudesse ser definido como doente crónico (para encher os cofres do sistema de saúde) e que batesse voluntariamente a bota ao entrar na idade da reforma (a fim de não ser um fardo para o capitalismo).
Foi a própria ciência médica que estragou os planos deste esplêndido cálculo. Ela foi de facto tão bem sucedida que cada vez mais pessoas estão vivendo muito para além da idade profissionalmente activa. Este é um exemplo particularmente claro de que a concorrência forçou um desenvolvimento das forças produtivas que já não é compatível com a lógica capitalista. A "força muda das circunstâncias" (Marx) provoca assim uma tendência para de algum modo anular as conquistas médicas factuais. A produção da pobreza artificial tem efeito preventivo. Assim, na Alemanha, a esperança de vida dos mais mal pagos baixou de 77,5 para 75,5 anos desde 2001. Quem nem sequer ganha dinheiro suficiente para a subsistência, apesar de trabalhar a tempo inteiro com desempenho esforçado, chega a velho tão exausto que já não consegue explorar as possibilidades da medicina. Mas também a assistência médica em si é cada vez mais reduzida de acordo com a capacidade de pagamento. Como os hospitais gregos estão praticamente falidos, as grandes empresas farmacêuticas suspenderam o fornecimento de medicamentos para o cancro, para a SIDA e para a hepatite; e o abastecimento de insulina também foi interrompido. Este não é um caso especial, mas a imagem do futuro. Pelo menos aos doentes pobres e "supérfluos", não mais utilizáveis do ponto de vista capitalista, será assinalado por todos os peritos o que já o rei Frederico da Prússia berrou aos seus soldados em fuga do campo de batalha: "Cães, vocês querem viver para sempre?"
[Original ÖKONOMISCHE STERBEHILFE in http://www.exit-online.org/. Publicado em Neues Deutschland, 09.01.2012.]
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