Um dos expoentes históricos do PSD, Marcelo Rebelo
de Sousa, disse hoje, no seu programa de domingo na TVI, que o documento do
FMI, recentemente divulgado, não era técnico, mas político. Disse assim
claramente que estávamos perante um tomada de posição política. Reconheceu uma
verdade evidente, mas reconheceu. Uma verdade que, pelo fato de ser evidente,
não deixa de ser perturbadora.
Realmente, vimos assim ser publicamente reconhecido,
por alguém insuspeito de esquerdismo, que um organismo internacional, ao
qual aliás pertencem países com governos de cores políticas
diversas, permite que um corpo de funcionários seus (nessa qualidade), sem
qualquer legitimidade para isso, se intrometa na vida política interna de um
país. Intromissão praticada através de uma tomada de posição
que reflecte e exprime uma
opção política concreta e específica, completamente carecida de qualquer
homologação ou validação democrática, ou de qualquer aceitação universal.
Para além do escândalo, no plano da ética política, que
isso representa, esse pequeno gang de engravatados, envolveu o seu
documento de propaganda com a falsa imagem de que ele era o resultado de uma
imparcialidade técnica que, por sua vez, reflectia uma ciência pura. Isto, para não falar da
duvidosa deontologia desse pequeno gang se ter aproveitado da situação concreta
de assistência financeira em que o país se encontra e do modo como a
casa mãe desses políticos de facto se situa nessa circunstância, para dar mais
força a esse embuste.
Tudo isto é moralmente repugnante, no plano do respeito
pelos valores democráticos e no plano da soberania do povo português, nada
tendo a ver com cedências de soberania livremente consentidos pelo Estado
português, em nome da sua inserção em sujeitos políticos supranacionais, seja
qual for a opinião que se tenha sobre essas cedências e o seu conteúdo. Mas,
neste caso, o desrespeito desta intromissão pela nossa soberania política
é gratuito, total e grosseiro.
No entanto, o cúmulo da degradação política está no facto
de, ainda por cima, ter sido um governo de um estado democrático que incitou o
pequeno gang de funcionários internacionais a
perpetrarem este desmando. Funcionários aliás confortados pela certeza de que, por pior que
seja o resultado da aplicação do seus conselhos, nenhum eleitorado os julgará por
isso e nenhum poder judicial os condenará. Um governo que abriu a porta a esta
intromissão na mira de que ela lhe servisse para os seus próprios desígnios. É
a política abaixo de zero!
Na verdade, pode ser legítimo que um governo, no respeito pela
respectiva Constituição e
pela legalidade democrática, faça propostas e tome medidas políticas que não
agradem a todos, sujeitando-se a posterior avaliação dos eleitores. Mas não é legítimo
o comportamento assumido. Tal como é pura mistificação intelectual, desprovida
de qualquer ética, procurar disfarçar de conclusões científicas as escolhas
políticas e ideológicas. É, todavia, ainda mais repugnante procurar blindar esta
mistificação, abrindo a porta aos mastins tecnocráticos do neoliberalismo,
para, com a ajuda das suas gastas receitas, dar força a essas medidas, com as
quais se vai massacrar socialmente o
povo português.
E que este governo se envolva em mais uma triste
embrulhada, quase se pode dizer que é
trivial. Mas que no seio das oposições haja quem pense que se pode ser manso
perante tais comportamentos do governo da direita e conquistar a confiança do
povo português, é cada vez mais uma inocência que
pode muito bem confundir-se com tacanhez política.
8 comentários:
Apoiado, sobretudo quanto ao último parágrafo. Para além dos défices das contas, também sofremos de um défice de oposição...
Pois é. O PS está numa encruzilhada. Tem que decidir. Apesar de estarmos no inverno, em política não se pode hibernar.
Estou certo que não é só o PS que está numa encruzilhada, está todo o país.
Seria bom que avaliassemos a crise num só todo, pois são todos os portugueses a pagá-la.
O Catraio
Não deixemos que ganhe centralidade o facto de ser dinheiro pago por portugueses que alimenta financeiramente o Estado, cujo governo pratica estas políticas, como se o estatuto central da nossa sociedade fosse o de contribuinte. Sublinhemos antes e bem que, muito mais do que o dinheiro de muitos, é a vida de todos que está em jogo.A vida, nunca o esqueçamos.A nossa vida. Por isso , é como seres humanos titulares de uma vida que nos devemos afirmar centralmente como cidadãos.É por isso que há uma sombra suicidária na passividade de cada um de nós quando ela realmente nos envolva.
ESTOU TOTALMENTE DE ACORDO Isto é uma situação de puro colonialismo que tem o apoio e colaboração deste Governo,o qual será julgado pelo Tribunal da História, e que estou convicto será severamente condenado.
Ora aí está..! É Colonialismo, e do mais avançado que há memória.
O Império,neste caso o Estado dominante, tem sempre os seus vassalos, quer sejam pessoas, quer sejam Estados...Tem de existir uma periferia frágil não activa à volta do Centro...
Fomos levados sem direito a voto, a integrar uma alternativa ao Império, diziam-nos...Hoje a União Europeia presta vassalagem ao Império...
Aceito que não concordem, mas o controlo da periferia petrolífera, pelo império com as suas guerras,
é o que sobra do Capital.
DE "O Catraio" respeitosamente.
O problema do petróleo é bastante, mas se lhe somarmos a qustão da água, piora muito mais. A água hoje,veja-se o Lago Chade,Centro africano, para exemplo...95% de liquidação ou
o Mar Aral...Estratégicos ou tácticos e coincidentes nessas regiões com o ouro negro.
É que nesta vida existem bastantes encruzilhadas para os socialistas, comunistas e republicanos, melhor dizendo para todas as facções/povos em geral.
Naturalmente, cabe, em Portugal, uma boa fatia dessa responsabilidade ao PS pelo seu envolvimento ante e pós CEE, moeda única e UE,contudo...e os outos?
Convém aqui dizer que pessoalmente me nego a tal rafeirisse.
Meter o Socialismo na gaveta é uma coisa.Deitá-lo no caixote do lixo da história é muito pior...E foi assim...
De o "Catraio" respeitosamente
Prezado Rui, conheci seu blog em pesquisa, li e gostei. Sou editor no Brasil, da editora Sulina, aqui edito livros Ciências Humanas, técnicos e lituratura..sou um dos editores do Edgar Morin, os 6 volumes dos Métodos são editados por mim e o mais recente é o "Meus Filósofos"..gostaria de seu contato, se for possível. Meu e-mail:
luisgomes@editorasulina.com.br
Sítio: www.editorasulina.com.br
lá tem nossos contatos das redes sociais também.
Enviar um comentário