Pensar politicamente os resultados de algumas sondagens
1.
Esbatido o ruído mediático que acompanhou a sua divulgação e os esforços dos
atingidos que procuram sempre afeiçoar os seus resultados ao sabor dos seus
interesses, vale a pena olharmos com alguma atenção para os resultados de cinco
sondagens difundidas entre 16 de janeiro e 13 de fevereiro. Duas da Universidade
Católica, duas da Eurosondagem e uma da Aximage . Quatro foram sondagens que
seguiram o modelo habitual, uma foi feita à boca das urnas nas eleições
presidenciais. Os resultados desta última mostram uma diferença ligeira
relativamente ao conjunto dos outros que refletem pesquisas realizadas antes e
depois das eleições presidenciais.
2.
Os resultados do PS oscilam entre 39 e 39,9%, no âmbito do grupo das quatro
sondagens, descendo para 35%, na sondagem feita à boca das urnas no dia das eleições presidenciais.
Os
do PSD, entre 26,2 e 28% no grupo das quatro sondagens , atingindo 28% no dia
das presidenciais.
Os
do BE, entre 6,5 e 7,2 % nas quatro, chegando a 8% na outra.
O
Chega, entre 5,5 e 8% nas quatro, chegando a 9% na outra.
A
CDU, entre 4,8 e 5,3% nas quatro, atingindo 6% na outra.
O
PAN, entre 2 e 3,5% nas quatro, tendo 2% na outra.
O
CDS, entre 0,8 e 2,5% nas quatro, tendo 2% na outra.
A
IL, entre 1,3 e 5% nas quatro, tendo chegado aos 7% no dia das presidenciais.
O
conjunto das esquerdas oscilou entre 50,8 e 52,1 % nas quatro, tendo tido 50%
na outra. As esquerdas não PS oscilaram entre 11,7 e 13%, tendo tido 14% no dia
das presidenciais.
O
conjunto das direitas oscilou entre 36 e 43% nas quatro, tendo tido 41% na
outra. A direita sem o Chega oscilou entre 31,4 e 35%, tendo tido 32% na outra.
Se
considerarmos o PAN como sendo o centro, os seus resultados estão acima
indicados.
3.
Estes números não representam uma antecipação dos resultados das próximas
eleições, mas retiram verosimilhança a premonições e cenários que pressuponham o seu
contrário. Larachas sobre mudanças de
ciclo político, alegações de que o governo está destroçado podem exprimir
desejos de quem os formula, mas não há verificação objetiva de que sejam uma
realidade.
Os
portugueses não transformaram a angústia e o sofrimento suscitados pela
pandemia numa rejeição do governo. Certamente, não porque entendam que a sua
ação não refletiu nunca qualquer erro, mas por verem que procurou sempre fazer
o melhor, tendo-o conseguido muitas vezes. Certamente, por perceberem que muito
do sofrimento e muitas das dificuldades resultam de ressonâncias estruturais do atual tipo de sociedade e não
de decisões conjunturais deste governo. Elas são seguramente um desafio, para este e para os próximos governos , mas
não são culpa sua.
E
não ressalta deste conjunto de sondagens que as oposições tenham visto a sua
popularidade explodir, como reflexo de uma apreciação entusiástica do seu
hipercriticismo antigovernamental.
4. Dos resultados
comentados podem extrair-se algumas conclusões.
O PS mostra
estabilidade na preferência relativa dos portugueses, mas com reforço da
posição alcançada nas últimas eleições legislativas (36,34%).
O PSD revela estagnação, já que nas eleições
de 2019 teve 27,76 %.
O BE mostra alguma
retração em face dos resultados de 2019: 9,52%. A CDU mostra uma ligeira
flexão, perante os 6,33 %, atingidos em 2019.Em conjunto ficam abaixo dos
15,85 % que somaram em 2019.
O CDS perdeu mais de
metade dos escassos 4,22 % em que ficou em 2019, colocando-se em risco de sobrevivência.
A IL fica claramente
acima dos 1,29% de 2019 e o Chega rondando os 9% distancia-se muito dos 1,29 de
2019, parecendo consolidar os resultados que o seu candidato atingiu nas
presidenciais. Desse modo, introduz instabilidade e incerteza na direita
portuguesa.
Portanto, se a direita
democrática resistir ao oportunismo de uma aliança com o Chega fica confinada a
uma oscilação entre 31,3 e 32,7% nas quatro primeiras sondagens, chegando aos
35% na sondagem feita no dia das eleições presidenciais. Se renunciar à sua
natureza democrática acolhendo o Chega, oscilará entre os 36,9% e os 43 % nas
quatro sondagens, tendo tido 41% no dia das presidenciais.
Parece poder
concluir-se que a ultrapassagem do conjunto das esquerdas pela direita não parece
provável, mas a ultrapassagem das esquerdas pela direita democrática mostra-se
uma hipótese muito remota. Não só à luz das sondagens de 2021, mas também em
função da trajetória inerente à sua comparação com os resultados das eleições de 2019.
Tanto mais que o período desde então decorrido já foi em grande parte sob a
pandemia.
5. A intensa campanha
política e mediática contra o governo e o PS não parece ter tido o efeito
pretendido pelos seus promotores. A tentativa de transformar o mais pequeno
erro do governo numa catástrofe de grandes proporções e de lhe imputar as
culpas por todas as dificuldades surgidas no país parece não estar a convencer o povo.
Do mesmo modo,
acumulam-se sinais de que assusta menos a continuidade deste governo do que a
hipótese de cair sobre nós um governo de direita. Em especial porque começa a
enegrecer essa ameaça o risco de um governo de direita não poder deixar de
incluir o Chega. É como se o fantasma do 24 de abril nos viesse assombrar meio
século depois de nos deixar.
Também parece claro que
a crispação antigovernamental dos partidos de esquerda que não estão no governo não se revela um caminho promissor para o seu reforço eleitoral. E embora com menos
nitidez parece merecer mais reservas aos seus próprios eleitorados a crispação
agressiva do BE do que a demarcação
tribunícia do PCP. No horizonte a ambos assombra a dificuldade em calibrarem bem a atitude de
oposição ao governo. Ou são tão eficazes na crítica ao PS que colocam a direita no poder, ou são tão
inábeis nessa crítica que apenas alteram ligeiramente a relação de forças.
Dificuldade acrescida por haver o risco de a crítica ao ser excessivamente agressiva , em vez de
desgastar o destinatário da crítica, desgastar os seus autores.
Mesmo a direita não
está livre de que isso também lhe aconteça. Na conjuntura atual o trauliteirismo
demagógico antigovernamental se passar certos limites pode virar-se contra os
seus promotores.