terça-feira, 28 de dezembro de 2021

UMA LINHA POLÍTICA CLARA E TRANSPARENTE

 

UMA LINHA POLÍTICA CLARA E TRANSPARENTE

1-AUTONOMIA ESTRATÉGICA

Na actual campanha, a linha estratégica do BE (gritante) e do PCP (menos trovejante) pode resumir-se em dois apelos dirigidos ao eleitorado que possa votar no PS:

- Não votem no PS para ele não ter maioria absoluta!

- Votem no PS para ele governar, de modo a poder tomar as medidas que nós achamos que devem ser tomadas.

2- REQUERIMENTO DO ELEITORADO, ALGO CONFUNDIDO:

- Vimos respeitosamente pedir a Vossas Excelências o obséquio de nos indicarem quais de nós devem votar e quais de nós não devem votar no PS.

3- PERGUNTA INCONVENIENTE DE UM ELEITOR DE LISBOA ESCALDADO:

- Nas mais recentes eleições autárquicas em Lisboa segui religiosamente as vossas instruções e o resultado foi o que se conhece: ganhou a direita. Têm a certeza que não acontecerá o mesmo, à escala nacional, se continuar a obedecer-vos?

 4- RESPOSTA ESOTÉRICA DOS PERGUNTADOS:

- Fomos à bruxa que alegadamente tem ajudado o FCP a ganhar campeonatos e ela garantiu-nos que com um pouco de sorte isso não ia acontecer.

5- MORALIDADE EM JEITO DE PERGUNTA:

- Se o PS não existisse a quem pediriam os partidos acima mencionados para lhes executarem as suas políticas?

 

terça-feira, 7 de dezembro de 2021

OS VIOLINOS TORCIDOS

 


OS  VIOLINOS  TORCIDOS

Pode ler-se numa página virtual do Expresso :

“Entre julho e setembro, face ao segundo trimestre do ano, só a Áustria e a França viram o PIB crescer mais que Portugal. A nível global, as economias da zona euro e da UE cresceram no terceiro trimestre, quer face ao período homólogo quer em cadeia, indica o Eurostat”.

Assim só pode lamentar-se que a realidade esteja tão largamente errada, alheia aos uivos de lamentação tremendista duma larga coligação de inefáveis aveludados, de subtis malandrecos, de rigorosos numerólogos, ou de simples tontos, que tão exuberantemente anunciam , prenunciam e inventam desgraças inenarráveis que espreitam este descuidado país. 

É uma tropa fandanga onde se acotovelam fantasmas acavacados e mal passados de natais  sofridos, as sereias ingénuas de um liberalismo imaginário, a atamancada ferocidade dos neofascistas, os paulíssimos das boas famílias, os chicões mais aguçados, o maior partido da oposição solidamente no centro da direita e até os pasteis subtis de todas as sedes de moderação.

Toda essa tuna de desafinados, absolutamente rigorosos, tenta desesperadamente apoucar e assustar o povo, na esperança de lhes cair no regaço a legitimidade política para devastarem o país. 

Um país espantado por ver estes oráculos pífios garantirem-lhe desgraças no preciso momento em que começam a levantar-se depois duma  tempestade que tão devagar se vem atenuando.  

Rapaziada da corda, muito cuidado. Estes violinos rombos de melodias inventadas.  anunciando-se como ungidos salvadores, mais não conseguirão nunca do que salvarem os seus privilégios e as suas mais ou menos discretas mordomias. 

Cuidado rapaziada, por detrás da sua retórica pessimista, a grande aposta desta gente o seu gritante sonho é o de conseguiram ser uma espécie de avesso do Robin dos Bosques : tirar aos pobres para dar aos ricos. Para isso, têm que afastar o PS da governação ou tolhê-lo o mais possível, substituindo-o, se possível, pela anemia crónica mas perigosa da direita .

Felizmente , a realidade tem resistido aos sonhos salteadores.

 

domingo, 28 de novembro de 2021

O MISTÉRIO DO LARANJAL EXTRAVIADO

 

O mistério do laranjal extraviado

Era uma vez um laranjal com um disfarçado perfume de direita. Discreto para não afastar os pacatos portugueses suaves. Suficientemente detectável para fixar a nebulosa conservadora, não desiludir o entusiasmo dos liberais, nem excluir os prisioneiros distantes da ressaca salazarista.

No passado, num tempo de pujança eleitoral, chegaram a falar em  cavaquistão. Há anos que muitos o procuram reencontrar num saudosismo infrutífero. Os museus acolhem memórias; não prenunciam regressos.

Ontem, houve dentro do laranjal uma competição feroz entre Rio e Rangel, para legitimar a entrega do leme partidário a um deles. O segundo desafiava o primeiro que, aliás, dirigia já o laranjal em questão.

Os notáveis, os notabilíssimos e os híper-notáveis, reconhecidos como frequentadores ou proprietários  do laranjal, fizeram os seus alinhamentos. Estilos diferentes: alguns deixavam deslizar um esgar aqui um sorriso ali sugerindo uma posição; outros almoçavam com, pouco inocentemente; outros recebiam indiscretamente cumprimentos. Só alguns desferiam verdadeiras cacetadas. Uns tantos frequentavam lançamentos e cerimónias sentando-se uns ao lado dos outros com um sorriso maroto. Queriam tornar bem clara a sua preferência sem que pudessem ser acusados de a ter explicitado. No meio desse  labirinto de subtilezas e de hipocrisias, pode nem sempre ter sido claro o apoio a Rangel, mas foi sempre evidente a recusa em apoiar Rio.

Marcelo, Balsemão, Cavaco, Moedas, Manuela Ferreira Leite, Passos Coelho, Poiares Maduro, Morais Sarmento, não apoiaram Rio. O chamado aparelho, ao que disseram vozes conhecedoras, também não. Apesar disso, 52,43 % dos votantes nas primárias deram a vitória a Rio.

Os derrotados, sem deixarem de o ser , deixaram contudo uma mensagem devastadoras quanto ao vencedor: Rui Rio não seria um primeiro-ministro desejável. Mas mostraram também que, todos juntos, só foram ouvidos por 47,57 % dos militantes do PSD que votaram. Para tão ilustre equipa é pouco, muito pouco, muitíssimo pouco. No entanto, Rio está desde já condenado a suportar o peso desses 47,57 % e da luzidia plêiade de notáveis que o abandonou. Incontornável!

Como podem os portugueses confiar para os governar em alguém que reúne uma tal unanimidade cética  de tão ilustres figuras tão próximas dele ?  

Por isso, se pode dizer que se há ainda um verdadeiro laranjal com o respetivo perfume ainda ativo , seguramente que se extraviou.

domingo, 21 de novembro de 2021

UMA RESSONÂNCIA POÉTICA DE COIMBRA.

“A cidade do tempo”─ Rui Namorado

[NOVIDADE LÁPIS DE MEMÓRIAS ]

 Livro  que é uma ressonância poética de  Coimbra 

P.V.P.: 12.60 euros

Pode encomendar o livro, com 10% de desconto e portes gratuitos, para geral@lapisdememorias.com 

 

 


O livro abre com a Nota Introdutória que a seguir transcrevo.

"O corpo central deste livro é constituído por um conjunto de poemas que são uma ressonância poética de Coimbra. Compõem-no duas partes. A primeira repercute a cidade como um todo; a segunda inclui ecos e memórias de pessoas que viveram em Coimbra, mais ou menos tempo, e de acontecimentos ou entidades que a envolveram ou envolvem.

Neste corpo central do livro, que aliás lhe dá o nome  A Cidade do Tempo ─, incluo alguns poemas já publicados em livros anteriores. Quando isso acontece, logo a seguir a cada um desses poemas vem mencionado o título do livro e a sua data de publicação.

Cada um destes poemas foi escrito na sequência de um impulso autónomo, alheio a qualquer intenção de o integrar num todo. A decisão de os organizar como conjunto e de os publicar como corpo central de um livro é uma homenagem à cidade ao seu povo e à sua história, mas também aos estudantes de Coimbra e à sua academia.

Este livro compreende também uma vertente complementar que, embora radicada na mesma vivência, na mesma experiência e na mesma criatividade não reflete Coimbra, explicita e diretamente. Tem a designação conjunta de “Outros Poemas”. Esta diversidade não propositada talvez possa ser lida subliminarmente como sugestão de que Coimbra é uma cidade estruturalmente aberta, cuja identidade mais profunda se radica nessa abertura.

                                        Rui Namorado

                                   ( Coimbra, 14 de julho de 2021)

sexta-feira, 29 de outubro de 2021

TONITROANTE HIPOCRISIA

 


Tonitruante hipocrisia

Na sua tonitruante hipocrisia, a direita decreta desesperadamente que a unidade de esquerda está morta. Todo o seu discurso pela boca dos mais seráficos ou insuspeitos porta-vozes diz que por isso chegou a sua vez.

Reparem: se descontarmos as ladainhas gastas dos narizes de cera neoliberais, a direita não é capaz de dar ao povo uma razão para votar nela. A não ser a sua estranha promessa de que vai enriquecer de imediato os ricos para que eles possam depois distribuir calmamente  aos pobres algumas generosas migalhas.

A mim parece-me que a direita só encontra como única razão para que votem nela o facto de a esquerda se ter desentendido.

O ruído vai crescer. Ela vai distribuir números esotéricos e prantos crocodílicos para nos dizer que Portugal está de rastos, preparando-se para tentar uma vez mais colocar-se em posição de permitir que os ricos e poderosos suguem mais livremente o país.

segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Cuidado com o Anjo da História!

 


Cuidado com o Anjo da História!

Quando na Alemanha o nazismo já começava a tornar-se visivelmente perigoso, o Partido Comunista Alemão recusou qualquer concertação com os socialistas do SPD, baseando-se numa linha política simples que se traduzia em “enterrar o nazismo sob o cadáver da social-democracia”.
O Anjo da História adormeceu e o nazismo não foi enterrado, floresceu. Uniu, nos campos de concentração e nos obituários do seu poder, comunistas e socialistas. Vários povos, a começar pelo povo alemão, sentiram-lhe o peso insuportável .
A água continuou a passar por debaixo das pontes e o Anjo da História foi acordando lentamente sem deixar de passar por múltiplas distrações. O nazismo pereceu nas caves mais fundas da indignidade e da ignomínia. O Partido Comunista Alemão já não existe. O SPD prepara-se para liderar o próximo governo por escolha democrática dos alemães.
A História não se repete mas é saudável não a esquecer. O seu Anjo não pára de nos surpreender

domingo, 24 de outubro de 2021

FÁBULA CANSADA

 



Em 31 de Dezembro de 2019 publiquei no meu blog  O Grande Zoo este poema. Infelizmente faz sentido recordá-lo.

 

Fábula Cansada

 

A esquerda atravessa o rio,

um sapo sob um lacrau.

 

O lacrau para ser lacrau

só pode sempre morder.

 

O sapo vai afundar-se

vencido pelo veneno?

 

O lacrau vai afogar-se

porque não pode nadar?

 

Que importa, clama o sapo,

este  caminho é o meu.

 

Que importa, diz o lacrau,

antes ser eu e morrer

do que pensar e viver.

 

Com o sapo e o lacrau

muito povo vai morrer.

 

Pergunto sem ironia,

não era melhor chegar?

          

                              [Rui Namorado]

domingo, 17 de outubro de 2021

O TRANSCENDENTE RANGEL E A LUZ

 


O transcendente Rangel e a luz.

O transcendente Rangel acendeu-se como um pirilampo mágico na alegada escuridão lusitana, tendo começado por transformar num discreto ribeiro o frondoso rio que afirmava sonhar que ganhou politicamente as eleições que perdeu. 

Antes de se ocupar generosamente de nos salvar a todos, não sabemos bem de que desgraças, propôs-se estancar sem piedade um espantado ribeiro. Não o deixando trovejar a sua imaginária vitória autárquica, confronto-o com uma refrega dramática que teve o país suspenso: as primárias do PSD eram ou não eram adiadas?

Os conselheiros espremeram rudemente as suas agitadas  mentes e deram ao transcendente Rangel um inesperado presente : não eram! O transcendente transcendeu-se ainda mais e ganhou um novo suplemento de alma, quando num esforço arqueológico reuniu apoios de velhas glórias de pretéritos desastres governamentais do PSD.

Concedendo subir à varanda da História, deu–nos a chave mágica das glórias futuras que nos oferecia e da fácil planície que nos levaria a percorrer. Desde logo ele prometeu oferecer-nos um elevador social que permitiria aos portugueses submetidos a um excesso de agruras, por uma sociedade desigual e injusta, que subissem na vida rumo à felicidade e ao sucesso. 

Os oráculos gregos esfregaram os olhos estremunhados perante a chegada abrupta de um novo colega capaz de inventar tão luminoso futuro. É certo que alguns deles se atreveram a estranhar que um tão forte defensor de um Estado fraco pedisse as rédeas do poder para dar corpo a um desígnio político tão intenso. Rangel acenava glorioso com a promessa de tornar o Estado paralítico para depois correr com ele os cento e dez metros obstáculos ─ um espanto.

 Alguns entre os mais céticos ainda perguntaram: “ Mas não seria melhor pensar um futuro em que não fosse necessário um elevador social por ninguém precisar de o subir?” Outros, mais presos a um presente que justamente  não suportam, acumulando-se desde já à porta do prenunciado elevador perguntam em uníssono : “Subimos todos?”

Embalado na ascensão irresistível, o transcendente deu mais um passo decisivo.  Como sinal de robustez do seu desígnio de subida, anunciou a sua ideia salvífica e decisiva de oxigenação da esfera pública: logo que lhe fossem dadas as rédeas internas do poder no PSD, sem mais delongas ele arrastaria os outros partidos na Assembleia da República para alimentarem atordoadamente o seu desígnio naturalmente transcendente. Os debates com o Governo deixariam de ser mensais e voltariam a  ser quinzenais. Os politólogos mais exigentes estremeceram de espanto, perante tão luminosa inovação político-institucional. A ciência política abriu a sua exigente porta e acolheu desvanecida este assomo de criatividade: Debates quinzenais!

Esta é a história que conta como o transcendente Rangel se acendeu como um pirilampo mágico na alegada escuridão lusitana.

quarta-feira, 13 de outubro de 2021

 PASTÉIS DE BELÉM?

Perpassou levemente pelo espaço mediático a sombra de uma notícia incómoda. Um ou outro raro jornalista, honesto ou distraído, deu-lhe breve e discreta existência.
Afinal o tonitruante caso da possível substituição do Chefe do Estado- Maior da Marinha não foi uma desastrosa secreção ministerial, com o perverso dedinho do Primeiro-Ministro. Não foi uma tenebrosa conspiração oculta, apontada à autonomia das forças armadas, fruto distante mas efetivo da lendária sofreguidão controladora do PS. Terá sido afinal , muito subtil e prosaicamente, um malabarismo radicado numa das casas que atuam no Palácio de Belém. Possivelmente forçando ligeiramente a mão do Presidente, mas seguramente entrando no jogo de sombras de humanas ambições almiranteares, que ousaram corroer o trajeto do grande chefe das vacinações nacionais.
A contenção discreta da nossa comunicação social e mesmo da feroz orquestra dos grandes comentadores não me deixaram afinal saber mais, ter uma certeza. É certo que achei algo estranho que quem foi tão intensivo na demolição de um ministro e na corrosão de um Governo tenha agora deslizado para um discreto silêncio que, parecendo distraído, não deixa de ser muito generoso para Belém e para as suas azougadas casas.
Por mim, caí num espanto ligeira por esta diferença de intensidade e de atitude, embora reconheça que a imparcialidade da nossa comunicação social e dos oráculos políticos mais evidenciados não é a sua qualidade mais evidente ( se é que ela realmente existe).
Mesmo assim não perdi a esperança de ouvir alguma trovoada , pelo menos por parte dos irrequietos porta-vozes que se julgam à esquerda do PS. E, mínimo dos mínimos, da nossa intemerata comentadora dos domingos.
É bem certo : a esperança é a última a morrer !

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

PENSANDO UM POUCO SOBRE O PRESENTE


A política não é uma sucessão de julgamentos morais em que se distribuam condenações, absolvições e louvores. Aproxima-se mais de ser uma pugna entre quem quer conservar o inigualitarismo social atualmente dominante e quem o quer combater e erradicar. Em Portugal, as esquerdas todas juntas( que são tendencialmente o primeiro desses dois lados) não têm por enquanto força suficiente para protagonizarem um processo de transformação social efetivo e duradouro. Depende de cada uma delas e do seu potencial de conjugação o aumento dessa força. Ao lutarem entre si não caminham no sentido do seu reforço, ficando mais longe de conseguirem uma efetiva mudança social que traga justiça e igualdade; ficam mais longe de responderem na prática às aspirações da respetiva base social. Aumenta assim o risco de explosões sociais dissipativas, que deixem o campo institucional aberto a um prolongamento da hegemonia da direita. E consequentemente aumenta o risco de um esvaziamento do envolvimento político-social do povo na resistência ao tipo de sociedade em que vivemos; ou seja das suas vítimas. E isso leva a um risco de anulação dos partidos de esquerda.
Será depois irrelevante apurar-se quem teve culpa do descalabro histórico, mas Portugal se isso acontecer cairá num severo buraco histórico; os portugueses ficarão bem longe dos seus mais legítimos anseios. É isto que está hoje em causa e não a esgrima florentina de lugares comuns, ainda que impregnados por uma aparente generosidade. A repetição de slogans previsíveis numa dialética inócua, um dia a dia previsível de diatribes cruzadas e cansativas.

sexta-feira, 1 de outubro de 2021

A força do destino…

 

A força do destino…

O actual panorama político mostra as direitas mais perto de uma frente comum pré-eleitoral do que as esquerdas. Apenas a  eclosão do Chega perturba essa tendência. E as esquerdas não se mostram apenas longe de uma frente pré-eleitoral, mostram-se distantes de qualquer tipo de frente. A manutenção desta diferença parece ser a única esperança de a direita ganhar legitimidade democrática para governar em Portugal.

Se cada uma das esquerdas se limitar a mostrar que a culpa da dispersão é das outras, tudo tenderá a ir-se complicando cada vez mais. Mas este bloqueio não é um mero jogo de xadrez político. Por enquanto, tudo indica que há uma maioria social e eleitoral de esquerda. Mas a maioria social pode deixar de ser uma maioria eleitoral, se os partidos da esquerda insistirem em resistir a uma conjugação estável de esforços que conduza a entendimentos ou alianças com ambição duradoura. Eleitoralmente podem pagar caro a persistência na divisão, dando ainda um inestimável presente às direitas; abrindo-lhes desastradamente as portas da governação.

Recordemos, aliás, as consequências da incapacidade de nos anos 80, o PS, o PCP e o PRD se entenderem para governar. Estruturalmente, ela gerou o “cavaquismo” e a prazo  levou à extinção do PRD. O PS e o PCP foram subalternizados durante uma década. Todos deveriam ter aprendido.

É claro que, atendendo à nossa história pós 25 de Abril , não será simples nem fácil. Podem ser diversas as eventuais resistências de cada um. Compreensíveis. Mas não há outro caminho que corresponda politicamente à actual relação de forças na sociedade portuguesa e que limite os riscos inerentes ao futuro incerto que temos pela frente.

quarta-feira, 29 de setembro de 2021

Frutos amargos

 

Mais tarde, poderei vir a fazer um comentário político global aos resultados das recentes eleições autárquicas. Deixemos assentar a poeira. Hoje, vou-me limitar a um comentário muito circunscrito, sem pretensões que transcendam o seu conteúdo visível. Vou falar muito genericamente da campanha do BE e dos seus resultados.

Se olharmos para o seu conteúdo, podemos dizer que as suas propostas estiveram em linha com o essencial da sua linha política. Mas esse conteúdo  foi expresso no quadro de uma estratégia que visou dois objectivos principais: aumentar o número de vereadores eleitos pelo BE e impedir maiorias absolutas do PS nos casos em que esse perigo  (na perspectiva do BE) existisse.

O primeiro objectivo falhou, já que o BE perdeu mais de metade das cerca de duas dezenas de vereadores que tinha.

O segundo, como o caso de Lisboa documenta, foi mais do que atingido: o PS mais do que não ter chegado à maioria absoluta não chegou sequer a uma maioria; perdeu as eleições. Tornou-se impossível assim ao BE obrigar o PS a comportar-se de acordo com as suas virtuosas indicações. Pelo que nos podemos interrogar sobre se este resultado é o pleno cumprimento do objectivo do BE ou a sua absoluta frustração.

Podemos andar às voltas de tudo isto com a imaginação própria das preferências de cada um de nós. Mas dificilmente podemos deixar de constatar que, se é certo que se pode envolver em subtis justificações a relação entre os resultados pretendidos e os conseguidos pelo BE, parece claro que com o modo como essa estratégia se concretizou a direita lucrou fartamente.

Os entusiasmos de Catarina tiverem pois alguns frutos, mas certamente amargos. Os vereadores salvadores com que ambicionava polvilhar as governações do PS de vários municípios não vão poder agir; ou porque não chegam a existir ou porque é a direita que está no poder.

Faço a justiça ao BE ao imaginar que estes frutos lhe são amargos.

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

PEDIR POUCO

 

Enérgica e perentória, Catarina apela à eleição de mais um vereador para o BE, em Lisboa ou noutro lugar, para assim abrir as portas  às coisas boas que os aturdidos munícipes já não esperavam .Uma chama incendeia-lhe o olhar, a felicidade está ao alcance das nossas mãos. Deem mais um vereador a Catarina e tudo será diferente.

É certo que podia pedir uma maioria absoluta para o BE, que assim teria os meios para realizar as suas esperanças. Mas Catarina é modesta. Tão modesta quanto entusiasta: não quer tanto, basta-lhe mais um vereador.

E é tão modesta que se inibe de ostentar toda a extensão do que nos promete. De facto, o seu contido desejo de mais um vereador, para além de poder ser a chave de uma boa fortuna, é muito mais do que isso, o princípio de um milagre. Não tão extraordinário, é certo, como o das rosas, mas seguramente também notável.

De facto, de um PS pesadão e relapso,  alérgico à abertura das generosas portas de Catarina, rumo a um início de respiração do paraíso, ela fará uma coleção de arcanjos, vocacionados para  o cometimento de todas as propostas  almejadas pelo BE. E afinal com uma condição muito simples: mais um vereador  para Catarina.  E, já agora, se não for pedir muito, não concedam ao PS maiorias absolutas.

Um cético oráculo da Grécia antiga talvez insidioso  encolhesse os ombros e regougasse : “Delírio, puro delírio”. Mas eu que sou um otimista do século XXI , generoso para com a alma humana ,afirmo com firmeza: “ Nada disso. Entusiasmo, voluntarismo , sonho  “.

segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Homenagem a um amigo

 

Jorge Sampaio sempre

 

Escreveste o teu futuro firmemente

na parede mais branca do destino

 

Colheste os labirintos do poder

sem medo sem soberba sem pudor

de mãos nuas e limpas   desarmadas

 

Os pássaros da noite não tolheram

a força tranquila dos teus gestos

o diamante intenso da revolta

 

Na inquieta bruma das palavras

disseste sempre todo o pensamento

sem que o gume do ódio te perdesse

 

Sentiste em ti o coração do mundo

batendo através de Portugal

gritando   gritando  humanidade

 

O grande rio do povo recolheu-te

e aí é que encontraste o teu lugar

sexta-feira, 28 de maio de 2021

ECONOMIA SOCIAL na Universidade de Coimbra



 Os estudos pós-graduados são hoje parte fundamental da missão universitária.

É com grande satisfação que vimos informar que se encontra aberta, até ao próximo dia 16 de julho, a primeira fase das candidaturas de acesso à Pós-Graduação em Economia Social – Cooperativismo, Mutualismo e Solidariedade para o ano letivo 2021/2022. A segunda fase decorrerá entre 1 de outubro e 15 de novembro de 2021.

As candidaturas são feitas online.

Para mais informações, consultar o folheto desta edição e a página web do CECES.

Para obter algum esclarecimento adicional sobre o curso e o seu funcionamento, pode contactar a Escola de Estudos Avançados da FEUC (eea@fe.uc.pt | T.: + 351 239 790 501/510).

 

Esperamos por si!

domingo, 25 de abril de 2021

Cravos de Abril

 


Cravos de Abril

         [25/04/2021]

 

Os cravos deste mês são de vermelho,

essa cor de sonhos inventados

pelo rude sabor da liberdade.

 

A cólera do povo encheu as ruas,

chegando de todos os lugares,

sem ódio, com paixão, desembainhada

pela cor já sem medo da justiça.

 

Glórias longamente abandonadas

percorreram de novo o seu caminho.

Foram ventos do sonho que acordaram

nesse dia de todos os abraços.

 

E os gumes mais ousados da aventura

ocuparam o dia deslumbrados.

 

                           [Rui Namorado]

sábado, 24 de abril de 2021

Comparação crítica de várias sondagens recentes

 

Comparação crítica de várias sondagens recentes


1.Em 23 de abril foi publicada no Expresso uma sondagem da responsabilidade do ISCTE. Ao contrário da maior parte das outras, esta não valoriza as décimas nos números que divulga, o que deve ser tido em conta na comparação com as que procedem de maneira diferente.

O PS é o partido que reúne um maior número de intenções de voto, atingindo os 37%. Relativamente à sondagem da mesma proveniência, difundida em dezembro passado, perde 2 pontos percentuais.

O PSD é o segundo partido, atingindo 29%; o que significa uma subida de 4 pontos relativamente à sondagem de dezembro.

O BE com 9% sobe um ponto percentual, enquanto o Chega com 6% regride um ponto. A CDU mantém os 7% de dezembro, tal como o PAN conserva os 2% .

O CDS baixa de 2 para 1%, enquanto a IL continua com 1%.

Deste modo, no seu todo, a Esquerda (PS,BE e CDU) desce de 54 para 53%,a Direita (PSD, Chega, CDS e IL) sobe de 35 para 37%. O Centro (PAN) conserva os 2% de dezembro passado. As Esquerdas exteriores ao PS passam de 15 para 16%, enquanto a Direita sem o Chega passa de 28 para 31%.

Embora a distância entre os dois maiores partidos tenha diminuído, ao cifrar-se em 8 pontos percentuais, mostra uma relação de forças idêntica à revelada pelos resultados eleitorais de outubro de 2019.Do mesmo modo, a vantagem da Esquerda no seu todo mantem-se ao nível da que resultou da pugna de 2019. Na verdade, em 2019 a diferença era entre 51,19 % para a Esquerda e 34,56% para a Direita; nesta sondagem é entre 53% e 37% respetivamente.

 

2.Em 18 de abril, foi difundida pelo Negócios e pelo CM uma sondagem da Intercampus. Tem algum interesse compará-la com outra da mesma proveniência divulgada há um mês (17 de março).

Foi o PS foi que registou o maior número de intenções de voto – 36,2 % - o que representou, no entanto, uma quebra de 1,4% relativamente ao mês passado. O PSD ficou praticamente estagnado nos 23,3 %, o que se traduziu num ligeira inflexão de o,3 %. A separar os dois partidos estão agora 12,9%, encurtando-se assim um pouco a diferença de 14% do mês passado.

O BE e o Chega ficaram empatados com 9,4%, o que resultado de uma subida de 1,1% do primeiro e de 0,4% do segundo. A CDU ficou com 5,2%, tendo assim subido 0,3%. O CDS, ao atingir 3,1%, subiu 0,8% , enquanto a Iniciativa Liberal ao recuar 0,5% , ficou-se pelos 4,8%. O PAN ficou no mesmo patamar, mas no seu caso isso representou um aumento de 2,3%. É este o peso do Centro, enquanto o da Direita no seu todo, de acordo com esta sondagem, seria de 40,6%. Bem longe dos 50,8% alcançados pelas Esquerda com assento parlamentar no seu todo.

Olhando para os grandes espaços políticos, entre as duas sondagens a Esquerda desceu 0,6 %, a Direita subiu 0,4% e o Centro subiu 2,3 %.

 

3. Para uma melhor avaliação do significado político destas duas sondagens vale a pena compará-las com outras publicadas em março e abril, inserindo esta última do conjunto considerado. São tidas em conta três publicadas em março ─ Aximage (01),Eurosondagem (06),Intercampus (17) e outras três em abril ─ Aximage (05),Eurosondagem (10), Intercampus (18).

No conjunto das seis sondagens, o PS oscilou entre um mínimo de 36,2% e um máximo de 39,7%; o PSD entre 23,3% e 28,2%. Em cada uma das sondagens, a diferença entre estes dois partidos variou entre um mínimo de11,1% e um máximo de 16,1%.

O BE oscilou entre 6,2% e 9,4% ; e a CDU, entre 4,5% e 6%. O PAN variou entre 2,1% e 4,8%.

O Chega variou entre 6,5% e 9,4%. A IL, entre os 2,1% e os 5,7%. O CDS oscilou entre 0,8% e 3,1 %.

No conjunto destas seis sondagens, a Esquerda (PS, BE e CDU) varia entre 50,8% e 54,3%; a Direita (PSD, Chega, CDS e IL) varia entre 38% e 40,6%; o Centro (PAN), entre 2,1 e 4,8%.

Vejamos agora, quanto à sondagem mais recente que comentámos no início deste texto, em que medida os seus resultados se situam dentro ou fora dos limites máximos e mínimos definidos pelos resultados das seis sondagens que acabamos de mencionar.

O resultado do PS (37%) situa-se dentro do intervalo entre o máximo e o mínimo, definidos por este conjunto de sondagens. O resultado do PSD (29%) situa-se ligeiramente acima. A diferença favorável ao PS entre os dois partidos (8%) situa-se ligeiramente abaixo.

O resultado do BE (9%) situa-se dentro do intervalo referido, o do Chega (6%),ligeiramente abaixo do limite mínimo, o da CDU (7%), acima e o do PAN (2%), ligeiramente abaixo. O CDS (1%) fica dentro do referido intervalo e a IL (1%), abaixo.

No seu todo, a Esquerda (53%) fica dentro do mencionado intervalo, a Direita (37%), ligeiramente abaixo e o Centro (2%), também ligeiramente abaixo. Também a Direita democrática (sem o Chega), na última sondagem, atingiu um patamar (31%) dentro do referido intervalo (entre 29,5% e 33%).

A diferença mais significativa diz ,  talvez, respeito aos resultados estimados para o PS e para o PSD, estando no facto de, na sondagem mais recente,  ela estar abaixo do limite inferior do conjunto das outras seis sondagens ((8 % contra 11,1%). De facto, quanto maior for esta vantagem do PS em melhor posição estará na disputa eleitoral autárquica. pode projetar-se em muitas vitórias autárquicas, sucedendo o contrário no caso oposto.

Mas esta diminuição de vantagem, ao conjugar-se com os outros resultados, tem um diminuto poder de pressão quanto a uma hipotética mudança de rumo no governo do país, em virtude da sua reduzida dimensão. Portanto, um olhar que abranja o conjunto de sondagens comentado revela , no essencial, uma relativa estabilidade nas referências eleitorais dos portugueses.

 

4. Pode assim servir de conclusão política genérica, o comentário publicado neste mesmo blog, em 16 de fevereiro, aos resultados de cinco sondagens difundidas entre 16 de janeiro e 13 de fevereiro. Duas da Universidade Católica, duas da Eurosondagem e uma da Aximage.

Na verdade, no fundamental, o cenário político em termos de intenções de voto não se alterou. Escrevi eu então:

“Parece poder concluir-se que a ultrapassagem do conjunto das esquerdas pela direita não parece provável, mas a ultrapassagem das esquerdas pela direita democrática mostra-se uma hipótese muito remota. Não só à luz das sondagens de 2021, mas também em função da trajetória inerente à sua comparação com os resultados das eleições de 2019. Tanto mais que o período desde então decorrido já foi em grande parte sob a pandemia.”

E agora estão em causa doze sondagens difundidas neste primeiro quadrimestre de 2021.

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quinta-feira, 22 de abril de 2021

MOEDAS FALSAS ?

 Moedas entrou em campo como sombra sonhadora da Comissão Europeia e da Gulbenkian, esperando assim escapar dos insalubres ecos “pafiosos”que de longe o vigiam.

Mas logo na segunda vez que se fez à bola, procurou ostensivamente, ainda que sem êxito, a canela do odiado adversário.

Assim mostrou que afinal quem funciona como sua verdadeira treinadora é a candidata do PSD na Amadora, uma acutilante loura de verbo selvático.

Os advogados subtis da “cheguização” do PSD, argutos “Observadores”, aplaudiram com entusiasmo. Porém, a moeda desvalorizou-se mais um pouco.

domingo, 18 de abril de 2021

ESTÃO A PERDER A VERGONHA....


Há uns dias atrás interroguei-me sobre uma estranha diferenciação que ressaltou de uma notícia dada na RTP. Hoje, acrescento mais duas materializações dessa  diferença de tratamento informativo quanto ao mesmo caso.

No Expresso de 16.04.21 na coluna dos “altos e baixos” incluída na página 4, nos “baixos” é destacada em primeiro lugar e identificada como tal a Presidente da Câmara Municipal de Vila Real de Santo António . Quanto a ela, diz-se que estão em causa “suspeitas de crime económico num processo que envolve a venda de um terreno”  e que a autarca, tendo sido detida para interrogatório, se demitiu na quinta-feira “depois de o MP ter defendido a prisão preventiva da autarca”. Não é dada qualquer indicação quanto ao partido pelo qual foi eleita.

Imediatamente a seguir, é identificado um deputado “que foi envolvido pela PJ “no mesmo processo que levou à detenção da autarca” o qual “foi alvo de buscas”, tendo dito que “desconhece o processo”. É dito que ele é candidato às eleições autárquicas, mencionando-se a sua pertença político-partidária que aliás  está também explicitada na legenda da fotografia.

No primeiro caso, omite-se a pertença político-partidária, no segundo caso, sublinha-se essa pertença. Por um estranho acaso, a autarca é do PSD (esconde-se), o deputado é do PS (mostra-se). Claro, que o estranho não é ter-se mostrado uma das pertenças, mas que tal se tenha feito ao mesmo tempo que se omitiu a outra.

Mas o Expresso não foi deixado sozinho. Fez-lhe companhia de novo a RTP. Ontem, 17 de abril no jornal das 8 pela voz do José Rodrigues dos Santos, as imagens sobre o caso foram comentadas, começando por se identificar o nome e a pertença político-partidária do deputado do PS que apareceu no ecrã. Imediatamente a seguir, também apareceu nas imagens da TV a autarca do PSD, mas o apresentador ignorou-a por completo, não a mencionando pura e simplesmente, como se ela fosse uma turista acidental captada por acidente pelas câmaras. Novo acaso, tão estranho como anterior.

Estas ocultações seletivas que apenas protegem o PSD indiciam parcialidade. Não uma parcialidade inerente a uma tomada de partido assumida, mas uma parcialidade inconfessada, melíflua e hipócrita. No Expresso , dada a sua natureza privada, a identidade do seu proprietário e a sua orientação ideológico-política genérica, apenas surpreende o primarismo do expediente que até pode perturbar o que reste da ilusão da sua independência. Na RTP trata-se pura e simplesmente do uso abusivo de um bem público, na medida em que são grosseiramente infringidas as regras mais básicas da equidistância político-partidária.

É claro, que estes casos em si  têm um significado menor, mas mostram com nitidez uma parcialidade instalada, que conhecemos, mas que costuma ser mais discreta. Por que razão? Ou perderam competência na  dissimulação da sua parcialidade; ou estão tão desesperadas pela inocuidade relativa dos seus efeitos que perderam a cautela; ou sentem-se suficientemente blindados para renunciarem ao disfarce, já em modo de pesporrência.


sábado, 17 de abril de 2021

Ressonância do 17 de Abril de 1969


Ressonância do 17 de Abril de 1969

         -homenagem às lutas estudantis pela liberdade e pela justiça

 

Está em sépia o perfume deste dia,

navegando a memória, cheiro antigo.

Passa a brisa dos dias docemente,

quase luz, melancólica saudade.

 

Eram negros os corvos desse tempo,

cercando cada gesto, cada passo,

sem tréguas, com ódio, sem pudor,

apodrecendo mais em cada dia.

 

Abrimos a janela do futuro

num incêndio de paz e juventude.

Rasgámos o cinzento que doía,

respirando por dentro da alegria.

 

Quantos anos passaram desfilando

por glórias, sonhos e paixões.

Deixamos que a memória nos semeie,

colhemos esse dia e somos sempre.

 

                       [Rui Namorado- abril de 2021]



segunda-feira, 12 de abril de 2021

O Brasil e o Partido dos Trabalhadores ─ perspectivas

 

                                                                                                      ALOIZIO MERCADANTE

O Brasil e o Partido dos Trabalhadores                                                 perspectivas

Identificando-se a si próprio,  Brasil 247  considera-se como sendo “um dos maiores sites de notícias do Brasil e defende a democracia plena, ideais progressistas, valores humanistas, o desenvolvimento da economia nacional, o multilateralismo na política externa e a informação como um direito de todos os cidadãos”.

 Dele transcrevo o texto (de 09/04/21) que se segue. Contém posições de Aloizio Mercadante, destacado dirigente do PT [Partido dos Trabalhadores] que desempenhou um papel de relevo nos governos deste partido. É um documento esclarecedor sobre o atual posicionamento do PT na complexa conjuntura que o Brasil atravessa. Eis o texto.

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Aloizio Mercadante foi entrevistado no programa 20 Minutos Entrevistas, em 07/04/ 21, pelo  jornalista Breno Altman. O entrevistado é atualmente presidente da Fundação Perseu Abramo, instituto de estudos e formação vinculado ao Partido dos Trabalhadores. E coordenou a construção do Programa de Reconstrução e Transformação do Brasil, lançado pelo PT em setembro do ano passado.

Segundo ele, o programa é o ponto de partida para convocar uma assembleia constituinte, que “é o nosso ponto de chegada”. 

“Precisamos construir as condições para convocar as assembleias constituintes e realizar mudanças que, se não fizermos, não vamos avançar”, defendeu. A constituinte permitiria revogar as reformas neoliberais promovidas no país desde o golpe contra Dilma Rousseff apenas com maioria parlamentar simples.

Muitos líderes de esquerda, no entanto, se opõem à convocação, apesar de todos concordarem que a Constituição brasileira já não é suficiente. O temor é que se chegue a um texto constitucional mais retrógrado, devido ao atual momento político do país.

Por isso, Mercadante reiterou que o programa do PT - que é apenas estratégico, não eleitoral - é o ponto de partida para criar essas condições. A proposta tem três dimensões, segundo explicou o também ex-senador e ex-ministro: urgência, reconstrução e transformação.

A urgência diz respeito à pandemia e refere-se não somente à proteção da vida, com vacina e auxílio emergencial, mas também a alternativas de reconstrução para sair da crise provocada pelo coronavírus.

“Não há saída para o país sem enfrentar a pandemia. Não há retomada da economia enquanto a pandemia não for superada e o Brasil tem todas as condições de enfrentar essa crise”, afirmou.

O ponto de reconstrução, por sua vez, trata de retomar projetos levados a cabo pelo PT durante os governos Lula e Dilma e que foram desmontados após o golpe de 2016. “Asseguramos o prato de comida no nosso governo, e agora tem gente passando fome”, afirmou.

Por fim, a categoria de transformação diz respeito aos novos desafios da atualidade. “É o momento da indústria 4.0, do 5G, em que falar de transição ecológica e realidade digital são pautas novas para o Brasil”, disse.

Segundo ele, o programa também contempla a necessidade de lutar para revogar medidas instauradas pelos governos Temer e Bolsonaro. Como exemplos, o presidente da Fundação Perseu Abramo citou a independência do Banco Central e o teto de gastos.

“Mas isso depende da correlação de forças no Congresso”, retomou. “Não basta votar no Lula, precisamos fazer bancada. Não é só vontade do governo. A esquerda precisa criar uma unidade mais ampla e mobilizar a população para ir às urnas”, argumentou.

Reforma tributária e bancária

Aprofundando-se em temas específicos do plano, Mercadante falou sobre a urgência de uma reforma tributária “justa e sustentável”, algo que ele considera “fundamental para sair da crise”.

Para ele, no entanto, uma reforma bancária não é necessária, pois três dos cinco principais bancos no Brasil são públicos: o Banco do Brasil, a Caixa e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). “O problema é que os instrumentos que nós tínhamos para garantir que essas entidades evitassem o monopólio do crédito por parte dos bancos privados estão sendo desmontados”, justificou.

“É necessário que a Caixa Econômica Federal, por exemplo, seja estatal, apesar de ser de capital misto, porque ela cumpre funções que uma instituição privada não poderia cumprir. Ela financia prefeituras, tem o cadastro do auxílio emergencial, é fundamental para o acesso do Bolsa Família. Tudo isso tem que ficar sob controle do Estado. Não é preciso que seja 100% pública, apenas a empresa-mãe deve sê-lo, e, neste caso, já é”, afirmou Mercadante.

‘O problema do SUS está no financiamento’

O presidente da Fundação Perseu Abramo também comentou sobre a questão da saúde, outro importante ponto do programa, e foi taxativo: “O problema do SUS está no financiamento” - não em como o sistema foi concebido.

“Se você mudar a arquitetura do sistema e não mudar o problema, vamos ter um cenário ainda mais grave. Passada a pandemia, vai aumentar muito a demanda, porque há uma demanda reprimida de cirurgias eletivas e tratamentos. Além das pessoas que perderam o emprego, por exemplo, e perderam o plano de saúde, então vão ter que passar a usar o SUS. E aí é evidente que a cobertura do SUS vai ser insatisfatória se não houver financiamento”, ponderou Mercadante.

Ele retomou a necessidade de uma reforma tributária, com tributação sobre lucros e dividendos, grandes fortunas e heranças, como forma de garantir o financiamento adequado.

Insuficiências do programa

O programa do PT não menciona, entretanto, a questão militar no país: “É uma insuficiência de uma formulação para a qual não temos respostas viáveis e promissoras”, afirmou Mercadante, que, por outro lado, reconheceu que a tutela militar do Estado “é um dos mais graves problemas da democracia brasileira”.

Ele afirmou que a revogação do artigo 142 da Constituição não seria o suficiente para resolver o problema. “Você pode revogar o artigo e ter golpe. Acho ingênuo achar que se muda toda uma instituição apenas com a revogação dessa emenda”, considerou.

O texto define as Forças Armadas como instituições nacionais permanentes e regulares que “se destinam à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. Bolsonaro e seus apoiadores interpretam o trecho como sendo uma autorização para a intervenção militar no país.

“É um problema muito mais profundo. O nível de controle de cima para baixo da instituição dificulta qualquer mudança. Teremos de negociar com os setores mais democráticos e compromissados com a nação dentro das entidades para realizar qualquer tipo de mudança”, defendeu.

Eleições de 2022

Mercadante relembrou que o programa do PT não é eleitoral, mas que ele estimula debates programáticos entre partidos, o que considera essencial, “porque acho que temos que construir uma aliança de esquerdas e um programa unitário. O PT não vai ter maioria nem para desfazer o que foi feito, quanto mais transformar, então precisamos dessa frente”.

Nesse programa único, ele ressaltou a importância de que constem reformas estruturais e o fortalecimento do Estado para poder lidar com as mudanças, sobretudo tecnológicas, do futuro e “alavancar o estado brasileiro” no cenário internacional.

“Vamos ganhar as eleições tendo uma direita golpista, armada, dentro das instituições, da polícia, das forças armadas. Precisamos de uma grande frente democrática, apoio popular e uma esquerda unida para enfrentar esse cenário. E Lula é parte da solução para os problemas. Não sei se ele será o candidato, mas tem uma grande capacidade de mudança e de unir a esquerda”, concluiu.