A incómoda mensagem de uma recente sondagem
1. Sem ser uma novidade, o modo como tem sido noticiada a
partir da sua fonte (O Observador) a
mais recente sondagem por ele divulgada reflecte com clareza todo um programa
político, ainda que de certo modo dissimulado.
De facto, noticia como se fosse o espelho fiel da realidade
política o contraponto entre o PS , por um
lado e uma alegada “direita junta”, por
outro. O PS teria 40,3% e essa alegada “direita junta” teria 41,1 % . A
mensagem subliminar é simples: a competição que conta é entre esses dois pólos.
De uma penada, faz-se desaparecer a extrema-direita (neofascista), que assim se branqueia implicitamente; esquece-se a autonomia da direita democrática, evitando-se que se mostre reduzida a uns escassos 32,7 % , nos quais o PSD fica encurralado com os seus 28,5%. Aliás, muito longe do PS; o que também se esquece.
Ao mesmo tempo, apaga-se da relevância o centro político (PAN- 2,2%) e as outras esquerdas( 10,8 % [BE 5,5% + CDU 5,3 %]) . Ou seja, os 8,4% do Chega e os 4,2 da direita democrática não-PSD contam, mas os 13% do centro e dessas esquerdas não existem.
2.Uma sondagem não é uma antecipação segura de um futuro
resultado, mas a proximidade relativa dos panoramas projectados por cada uma
delas reforça a probabilidade de conterem previsões criveis. Destes resultados, se
os compararmos com os resultados das eleições legislativas de 2019, ressaltam
algumas constatações:
1º A campanha da direita e da extrema-direita, acolitadas
por uma boa parte da comunicação social, apesar de uma intensa barragem de
propaganda nesse sentido, não têm conseguido transformar o mérito deste governo
num fracasso;
2º A direita democrática atinge nesta sondagem uns modestos
32,7%, abaixo dos 33,27 % que conseguiu em 2019.
3º A extrema-direita (neofascistas) subiu de 1,29% para
8,4%.
4º O PS subiu de 36,34 para 40,3%, isto é, cerca de 4%.
5º As esquerdas exteriores ao Governo do PS passaram de
15,88 % em 2019, para 10,8% nesta sondagem. Mas esta descida depende de duas
parcelas desiguais: o BE desce 4% e a CDU cai 1%.
5º Se considerarmos o PAN como sendo o centro político,
constatamos que perdeu cerca de 1 % (3,32/2,2 %).
Daqui podem tirara-se algumas conclusões.
1ª O tipo de campanha política contra o actual Governo, feita
pelos partidos de direita e de extrema-direita, bem como pela matilha mediática que os
acompanha, beneficiou principalmente o Chega (+ 7,2%) e apenas ligeiramente a
IL (+1,2%) e o PSD ( +0,8%). Nada aproveitou ao CDS (- 2,4%). Globalmente, a
soma da direita e da extrema-direita aumentou 6,6 % (de 34,56% para 41,1). Ou
seja, só beneficiou significativamente o Chega.
2ª Não o fez, no entanto, à custa da esquerda no seu todo, a qual desceu apenas de 52,19% para 51,4 % e continua com uma vantagem superior a 10% em face do outro conjunto antes referido. Mas esta relativa estabilidade não é interiormente
homogénea: o PS sobe 4%, o BE desce 4% e a CDU perde 1%. Parece que ser o
partido do governo não foi penalizador, mas a demarcação em face do governo dentro
da esquerda não entusiasmou os respectivos eleitores. Pode mesmo dizer-se que o
modo de distanciamento/oposição, nestes casos, foi quatro vezes mais
penalizador para o BE do que para a CDU.
3º Sem os neofascistas do Chega a direita democrática não
tem como expectativa realista chegar ao governo proximamente, mas mesmo com o
seu concurso está muito longe de poder considerar essa hipótese como provável.
4º Uma colocação em minoria do conjunto das esquerdas em
próximas eleições parece improvável, como
também o parece a conquista de uma maioria absoluta pelo PS. Mas o
exacerbar do urgentismo antigovernamental e duma hostilidade ao actual governo que possa favorecer a direita podem suscitar uma deslocação de voto favorável ao PS no
seio do conjunto das esquerdas. E com base nos resultados desta sondagem parece
que este exacerbar da hostilidade ao governo é o único caminho que pode tornar
provável uma maioria absoluta do PS.
Principais conclusões finais a retirar :
I-
As campanhas feitas a partir das várias direitas
e da extrema-direita têm beneficiado o Chega, de pouco tendo
aproveitado aos partidos da direita democrática e não tendo afectado negativamente o PS.
II-
A via seguida pelo BE a partir da votação do
orçamento, parecendo levá-lo a combater o governo, tem-se virado afinal contra ele próprio.